Brasil

Dia da Consciência Negra é feriado no Brasil?

A Lei n.º 12.519, de 10 de novembro de 2011, instituiu o dia 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra. É um dia voltado para a reflexão sobre o que movimenta a criação da data, que está no calendário oficial de feriados em apenas parte do Brasil, como Alagoas, Amazonas, Amapá, Mato Grosso e Rio de Janeiro. Também é feriado municipal em 1.260 cidades brasileiras. Como o Brasil tem 5.568 municípios, o Dia da Consciência Negra é, portanto, feriado em 29% das cidades do país.

Em setembro deste ano, a data entrou para o calendário oficial de feriados em São Paulo. A lei que inclui a data no calendário oficial do Estado de São Paulo foi sancionada em 13 de setembro, pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e publicada no Diário Oficial. O projeto de lei 17.746/23 é de autoria do deputado Teonilio Barba (PT). Em nota, o governo estadual afirma que o objetivo de celebrar a data é “potencializar a importância do debate sobre o povo e a cultura africana no Brasil, seja por meio da música, da política, da religião ou da gastronomia, entre várias outras áreas”.

História da Consciência Negra

No Brasil, a história da consciência negra culminou na criação do Dia Nacional da Consciência Negra, uma data que celebra a negritude e a luta da população preta de nosso país. No entanto, a história por trás disso é mais longa. Ainda no século XIX, negros alforriados e seus filhos, muitos dos quais tiveram a oportunidade de estudar (como o advogado e jornalista Luiz Gama, o patrono da abolição da escravatura no Brasil), impulsionaram o movimento abolicionista, que advogava pelo fim da escravidão em nosso país.

Intelectuais e políticos brancos também endossaram o movimento. No dia 13 de maio de 1888, não conseguindo mais resistir à pressão interna do movimento abolicionista e nem à pressão externa promovida principalmente pela Inglaterra, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea, abolindo a escravatura em nosso país. A trajetória dos ex-escravos libertos não foi fácil. Eles não tiveram direito à terra nem a qualquer tipo de indenização. Começaram a viver à margem da sociedade, iniciando a difícil trajetória da população preta após a abolição em nosso país. Mesmo compondo uma comunidade em sua maioria pobre e marginalizada, a cultura negra, com suas ricas raízes africanas, continuou se desenvolvendo.

Em 1971, o professor, escritor, pesquisador e militante negro Oliveira Silveira organizou um grupo de estudo e apreciação da cultura e da literatura negra em Porto Alegre com outras pessoas interessadas no assunto. O grupo propôs a criação de uma data comemorativa que simbolizasse a união e a luta do povo negro. O dia 20 de novembro foi escolhido por ser o dia da morte de Zumbi dos Palmares, personalidade considerada símbolo de luta e resistência contra a escravidão.

O grupo sofreu certa perseguição, pois, na ocasião de seu nascimento, o Brasil vivia o auge dos chamados anos de chumbo da Ditadura Militar. No entanto, os movimentos sociais que atuavam em defesa da população negra cresciam cada vez mais em nosso país. Em 1978, inclusive, foi criado no Brasil o Movimento Negro Unido (MNU).

Em 1988 foi promulgada a atual Constituição Federal de nosso país, apelidada pelo deputado Ulysses Guimarães como Constituição Cidadã. Ela recebeu esse carinhoso apelido por ser resultado de uma intensa consulta popular de vários setores da sociedade, representados por deputados e por movimentos sociais que puderam participar das sessões de criação e votação do texto constitucional. Um dos princípios estabelecidos na constituição é a igualdade e o veto à discriminação por qualquer motivo, inclusive racial.

Em 1989 foi promulgada a Lei n.º 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que dispõe contra o preconceito racial, tornando a discriminação racial, de cor, de religião ou nacionalidade um crime passível de punição penal. Entre embates judiciais, leis e a luta dos movimentos, o sentimento de empoderamento e a necessidade de se celebrar a africanidade cresciam cada vez mais, aumentando a necessidade de se criar uma lei que determinasse a data proposta na década de 1970 como uma data comemorativa.

Consciência negra e o Zumbi dos Palmares

Zumbi dos Palmares é tido como uma das maiores personalidades representativas da força e da luta da população negra em nosso país. Muito pouco se sabe sobre a história de Zumbi, inclusive muitos dados são apontados como lendas. No entanto, a representatividade de Zumbi coloca-o como um herói e une a comunidade negra em prol da defesa de seus valores e de sua cultura.

O Zumbi teria liderado por anos o Quilombo dos Palmares, um complexo de quilombos na região da Serra da Barriga. Na época, a região pertencia à Capitania de Pernambuco, sendo atualmente o estado de Alagoas. Dados apontam que a morte de Zumbi teria ocorrido em 20 de novembro de 1695, em combate e fuga. Daí veio a escolha do dia 20 de novembro como data de celebração do Dia Nacional da Consciência Negra no Brasil.

O Dia da Consciência Negra é importante para relembramos que a nossa sociedade foi construída por meio da escravidão. Por mais que melhorias e mudanças tenham acontecido, a falta de oportunidades para a população negra, o racismo presente nos detalhes do cotidiano e as tentativas de apagamento de cultura africana evidenciam que ainda temos um longo caminho a ser trilhado.

Alguns indicativos podem nos ajudar a entender o problema do racismo no Brasil, já que inúmeras pesquisas a respeito disso tem sido realizadas nos últimos anos. Em um levantamento realizado após as eleições de 2018, somente 4% dos políticos eleitos para o Legislativo autodeclaram-se negros. A pesquisa indicou que, entre deputados distritais, estaduais, federais e senadores, somente 65 dos 1626 eleitos declaravam-se negros.

Outros dados apontam que cerca de 56% da população autodeclara-se negra (pretos ou pardos) , mas, entre os mais ricos, os negros representam somente 17,8%. Em contrapartida, os negros representam 75% dos mais pobres, além de corresponderem à maioria dos presos no Brasil: 65%. Além disso, os negros são mais condenados que os brancos quando são processados por posse de drogas. No entanto, paradoxalmente, eles são apreendidos com doses menores de substâncias ilícitas em relação a condenados brancos. Não só a justiça demonstra ser mais rigorosa contra os negros, mas a polícia também, uma vez que 76% dos mortos pela polícia são negros.

Também é válido mencionar que, no mercado de trabalho, os negros também sofrem com o preconceito, pois, recebem, em média, 1200 reais a menos em comparação com os trabalhadores brancos. Até no desemprego, os negros sofrem mais, uma vez que mais de 60% dos desempregados são negros. O racismo foi tão impregnado na cultura do brasileiro que até no vocabulário ele se manifesta. Expressões como “da cor do pecado”, “denegrir”, “mulato”, “cabelo ruim” (para se referir ao cabelo crespo). Entre outras tantas, denotam claramente o racismo e surgiram do legado dos mais de 300 anos de escravidão no Brasil.

A cultura religiosa oriunda dos negros africanos também sofre bastante com o preconceito no Brasil. Na década de 1930, as chamadas religiões de matriz africana eram proibidas no Brasil. Atualmente, apesar de a Constituição prever a liberdade religiosa, o que se vê em nosso país é que as religiões de matriz africana são intensamente perseguidas. Um fenômeno recente são as ações de vandalismo cometidas contra terreiros nos quais se praticam os encontros de umbanda e do candomblé.

Até na escola, há enorme resistência com a cultura africana, pois há pais de alunos que se recusam a permitir que seus filhos tenham acesso a conhecimentos e saberes relativos às culturas de origem africana. Até mesmo professores, muitas vezes, recusam-se a ministrar os assuntos relacionados com a cultura afro-brasileira para os alunos, apesar de existir uma lei que os obrigue a fazê-lo.

Confira ações e eventos em todo país

Para o mês de novembro, o Ministério da Igualdade Racial mapeou cerca de 230 ações que vão ser realizadas por todo o território brasileiro durante o Mês da Consciência Negra e as reuniu em um mapa virtual. As atividades são promovidas por entidades da sociedade civil e por órgãos ligados ao Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir). Os eventos variam entre rodas de conversas, palestras, marchas, encontros, lançamentos, desfiles, e outras modalidades.

A iniciativa faz parte da campanha Brasil pela Igualdade Racial, que tem como foco o Dia Nacional da Consciência Negra, comemorado no dia 20 de novembro. Grande parte dos eventos tem como objetivo relembrar a luta negra e mostrar como a cultura afro-brasileira perpassa por todo o país de diversos modos. Membros da sociedade civil que estejam promovendo eventos com foco no novembro negro e queiram que eles façam parte do Mapa pela Igualdade Racial, podem se inscrever pelo formulário que o MIR disponibilizou. É possível cadastrar até 5 eventos por entidade.


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